Rapaz autista, de óculos, jogando fliperama e várias pessoas assistindo

Jovem autista encontra refúgio no fliperama e se torna campeão mundial

02/06/2017 Deficiência Intelectual, Histórias de vida, Notícias 0
Rapaz autista, de óculos, jogando fliperama e várias pessoas assistindo

Robert durante o campeonato mundial de pinball: pessoas se aglomeram para vê-lo jogar

Quando o canadense de 27 anos joga fliperama na galeria perto de sua casa, nas redondezas de Vancouver, geralmente uma multidão se reúne para assistir. Robert tem tanto controle do jogo que é capaz de fazer com que cada bolinha permaneça “viva” por até uma hora. Ele frequentemente quebra recordes, deixando suas iniciais – REG, de Robert Emilio Gagno – no ranking de vencedores.

“Se estou jogando por diversão, consigo repetir tiros certeiros sem parar e, ao mesmo tempo, descobrir quais são os movimentos que recebem o maior número de pontos”, revela o jovem.

Ele se debruça quase que horizontalmente sobre a máquina de fliperama, movimentando a bola cuidadosamente sobre os flippers (as duas alavancas usadas para impedir que as bolas caiam na caçapa), antes de atirá-la para o campo de jogo, enquanto o brilho das luzes explodindo dos bumpers (os obstáculos em forma de cogumelo) se reflete em seus óculos.

Robert diz que foi essa combinação de luzes e sons que primeiro o atraíram para o jogo.

“Quando ele tinha cinco anos, uma vez eu o levei para comer um hambúrguer”, conta o pai, Maurizio. “Havia uma máquina de fliperama no canto (da lanchonete) e ele ficou mais interessado nela do que na comida. Minha mulher, Kathy, e eu percebemos que poderíamos sentar e relaxar um pouco enquanto Robert jogava.”

Kathy, a mãe, percebeu que seu filho era “diferente” logo cedo. Ele era fascinado por avisos de “saída” dos lugares, gostava de girar em círculo e gritava durante encontros com outros pais e crianças.

Rapaz autista conversa, animadamente, com outro jovem em um salão cheio de máquinas de fliperama

O fliperama ajudou Robert a desenvolver habilidades sociais e fazer amigos

Robert passou a competir em torneios de fliperama aos 19 anos. Hoje ele é o principal jogador do Canadá e está entre os dez melhores do mundo.

Ele acha que o autismo melhorou suas habilidades no jogo.

“Acho que consigo focar em uma única coisa por um bom tempo e tenho uma forte memória visual. Então só preciso jogar uma vez em uma máquina para me lembrar (dela). Também consigo perceber várias coisas acontecendo ao mesmo tempo e rapidamente calculo para onde a bola deve ir.”

Mas, a condição também traz desvantagens. Robert tem dificuldade em identificar certas “pistas” sociais, como o melhor momento em dar um abraço num amigo.

“Acho difícil entender quando falar e quando não falar, ou decidir qual a melhor forma e momento de cumprimentar pessoas”, comenta.

Ele também sofre para escolher “as palavras certas” para cada situação. Em um documentário sobre ele, chamado Wizard Mode, ele é questionado sobre o que gostaria que um empregador soubesse a seu respeito. “Que sou afetuoso”, responde. Ao que sua mãe agrega: “Acho que você quer dizer que é amigável e consegue se relacionar com as pessoas”.

E o autismo também pode ter um efeito negativo em seu jogo.

“Tendo a ficar mais ansioso e posso ter dificuldade de concentração se estou incomodado ou preocupado. Quando isso acontece, não jogo tão bem”, explica Robert.

Jovem autista, com um headphone no pescoço, conversa com um homem mais velho, de cabelos brancos, e leem um papel

Maurizio é pai de Robert e se tornou uma espécie de treinador, ajudando-o a se escrever nos torneios e se concentrar

Quando está às vésperas de um campeonato, ele joga fliperama por cerca de duas horas ao dia. Seu pai o ajuda nos preparativos para as inevitáveis mudanças de rotina durante os torneios – algo que costuma ser trabalhoso para Robert.

“Conversamos sobre coisas como a espera nos aeroportos”, relata Maurizio. “Eu também faço as inscrições nos torneios e fico de olho para que ele se alimente e durma o suficiente, caso contrário, ele provavelmente esqueceria disso.”

Maurizio é uma espécie de técnico, ajudando Robert a se manter calmo e não deixar que partidas ruins o atrapalhem.

Eles participam de torneios na Europa, no Canadá e nos EUA. O prêmio mais cobiçado é Campeonato Mundial de Fliperama da Associação Profissional e Amadora de Pinball (Papa, na sigla em inglês), realizado na Pensilvânia, de onde sai o campeão mundial.

Robert tentou a sorte no ano passado e surpreendeu. Avançou rapidamente e chegou à final contra o favorito, Zac Sharp, que escolheu a máquina em que competiriam – Flash Gordon, um fliperama antigo e notadamente difícil. Mas, a alta pontuação obtida por Robert em sua segunda bola mostrou-se imbatível. Momentos depois, o canadense estava com o troféu de campeão mundial nas mãos, sob o olhar marejado de seu pai.

“Fiquei tão feliz e orgulhoso de vencer o Papa”, conta Robert. “Adoro provar às pessoas que elas estavam erradas quanto a mim.”

Jovem autista, sorrindo, com um trofeu a sua frente

Robert com o troféu de campeão mundial de fliperama em 2016

Robert continua a competir no fliperama, mas seu foco hoje é em se tornar mais independente. Ele trabalha duas manhãs por semana em um banco e, à noite, cursa programação de computador. Ele também já deu palestras sobre sua carreira no fliperama. Ainda vive com seus pais, mas sonha em morar sozinho.

“Também gostaria de ter uma namorada e me casar algum dia”, conta.

Orgulhosos, seus pais o estimulam a encarar novos desafios.

“Robert é um cara bonito, disse para ele se inscrever em sites de namoro”, diz Maurizio. “Não quero que ele se sinta limitado ou tenha qualquer barreira.”

* Texto de Claire Bates, do Serviço Mundial da BBC (clique aqui)

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